REVISTA ÉPOCA
27/08/2011
Rui Falcão: "A Marta não vai desistir"
O presidente do PT diz que o partido caminha para prévias na escolha do candidato a prefeito em São Paulo, apesar de essa não ser a vontade de Lula
LUIZ MAKLOUF CARVALHO
Rui Falcão foi um dos homens de confiança da senadora Marta Suplicy durante sua gestão na prefeitura de São Paulo, entre 2001 e 2004. Guindado em abril à presidência do PT, Falcão está agora na delicada situação de arbitrar um conflito interno no partido, em que a antiga chefe é uma das protagonistas. O problema é que do outro lado do ringue se encontra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Presidente de honra do PT, Lula está se movimentando para que o ministro da Educação, Fernando Haddad, seja escolhido o candidato do partido nas eleições do próximo ano à prefeitura de São Paulo, em detrimento de Marta. Apesar das pressões para que Marta abdique em favor de Haddad, Falcão disse a ÉPOCA, na quarta-feira, que não acredita que ela abrirá mão da pretensão de ser novamente candidata a prefeita da maior cidade do país.
ÉPOCA – O ex-presidente Lula está "tratorando" o PT ao bancar a candidatura do ministro da Educação, Fernando Haddad, a prefeito de São Paulo?
Rui Falcão –O Lula é a maior liderança do PT e sempre foi muito ouvido. Essa expressão "tratorando" não se aplica, porque, embora ele argumente e faça manifestar suas preferências, nunca impôs isso ao partido.ÉPOCA – Ele tem dito, referindo-se a Haddad, que São Paulo precisa de algo novo. A senadora Marta Suplicy diz que, se Lula quiser perder, fique com Haddad. Como se resolve esse conflito?
Falcão – O Lula está chamando as pessoas para conversar. Ele não pediu para ninguém retirar sua candidatura. Então nós estamos caminhando para uma prévia, que está prevista no estatuto do PT.
ÉPOCA – Dizer que Lula vai perder se for com Haddad não é uma provocação?
Falcão – Não é provocação. Uma frase como essa puxa manchete, mas ela quis dizer o seguinte: "Eu conheço mais a cidade, eu tenho mais diálogo com a população e, portanto, eu sou a candidata favorita. Então, se alguém quer perder, apoie o outro candidato". É uma avaliação, com base em pesquisa.
ÉPOCA – O que vê de novo em Haddad?
Falcão – O argumento da novidade não é bom para qualificar o Haddad, que tem outras qualidades. Novidade são também o Jilmar Tatto e o Carlos Zaratini (deputados do PT por São Paulo) porque conhecem a cidade, foram secretários e têm realizações para mostrar. No passado, o Lula já disse que um dos problemas do PT é que ele não repetia candidato.
ÉPOCA – Sua candidata é a Marta?
Falcão – Não tenho candidato. Como presidente do PT, não devo manifestar preferência neste momento.
ÉPOCA – Marta pode abrir mão de sua pretensão à candidatura?
Falcão – Meu feeling é que ela não vai desistir. Ela tem dito a apoiadores dela que vai continuar.
ÉPOCA – Qual é sua avaliação do desempenho da presidente Dilma, de 0 a 100?
Falcão – Dou 100. Minha expectativa era diferente da dos outros. Já sabia de suas qualidades. Então não tive surpresa diante do que ela está fazendo. E não tem crise nenhuma com o Congresso.
ÉPOCA – Não?
Falcão – Até agora, todos os projetos do Executivo foram aprovados. Se a gente contar, só perdeu um artigo do Código Florestal, que está sendo revisado no Senado. E, se não for revisado, na linha de manter a anistia dos desmatadores, tenho certeza de que ela vai vetar.
ÉPOCA – O senhor acha que está todo mundo contente com a presidente?
Falcão – Não tem crise nenhuma. Crise é quando o governo começa a ter seus projetos rejeitados, quando há paralisia.
ÉPOCA – O senhor tem medo do poder do vice-presidente, Michel Temer?
Falcão – Não tenho medo do poder do Temer. O Temer, integrado ao governo, como vice-presidente, cumpre um papel positivo de estabilidade e negociação.
ÉPOCA – E, descontente com o governo, que tipo de bomba ele pode detonar?
Falcão – Ele não está descontente com o governo, até porque ele participa do núcleo de coordenação.
ÉPOCA – Os políticos estão gostando da atuação da presidente?
Falcão – Participei de uma reunião com a presidenta Dilma, no Palácio da Alvorada, em que estavam o presidente do PMDB, Waldir Raupp, o líder do governo no Senado, Romero Jucá, o Michel Temer, o líder do governo no Congresso, Mendes Ribeiro, hoje ministro da Agricultura, e o líder do PMDB na Câmara, Henrique Eduardo Alves. O Henrique é aquele deputado que fez aquela brincadeira de dar um bambolê, para aumentar o jogo de cintura. Ela conduziu tão bem que, ao final, o Henrique falou: “Olha, saio daqui feliz; e quero dizer uma coisa para a senhora: pode me devolver o bambolê”.
ÉPOCA – O senhor a conheceu durante a ditadura, em circunstâncias em que ela não tinha exatamente jogo de cintura...
Falcão – Nenhum de nós. Naquele época, o problema não era ter jogo de cintura, mas escapar. Nós nos acostumamos com a ideia do político como o cara que negaceia, não diz o que pensa, é sinuoso. Costuma-se atribuir isso como qualidade. E essas qualidades ela não tem. Ela é direta, incisiva, mas vislumbra as coisas e dialoga. É outro tipo de fazer política.
ÉPOCA – Como presidente do PT, que relação tem com a presidente Dilma?
Falcão – Agora em agosto, eu disse: “Olha, estou vindo toda semana a Brasília, e de vez em quando vou ligar para você, nem que seja para 15 minutos de conversa”. Ela disse: “Você não tem vindo mais porque você não quer”. Foi um gesto muito grande de aproximação.
ÉPOCA – Do mensalão para cá, para boa parte da opinião pública, o PT perdeu o princípio da ética. Como vê essa avaliação?
Falcão – Uma pesquisa recente, feita pelo Vox Populi, além de colocar o PT como um partido com 32% da preferência nacional, revelou que os entrevistados acham que os políticos mais honestos estão no PT. Nós não perdemos essa bandeira da ética e do bom trato com os recursos públicos. Tudo o que nosso governo fez, com o apoio do PT, do Lula para cá, vai na direção de convalidar que nós temos esses valores.
ÉPOCA – Existe diferença entre Lula e Dilma em relação ao combate à corrupção?
Falcão – Esse é um jogo que tenta provocar, em vão, cizânias, nos dividir e minar a base de sustentação do governo, que é mais ampla que a do Lula.
ÉPOCA – O que espera do julgamento do mensalão pelo Supremo Tribunal Federal?
Falcão – O Supremo não vai querer fazer esse julgamento em 2012, podendo isso ser explorado eleitoralmente num sentido ou em outro. O mais provável é ficar para 2013. Acho que o Supremo vai julgar de acordo com os autos. Se julgar de acordo com os autos, não há como condenar ninguém. Não há provas materiais.
ÉPOCA – Não é essa a posição da Procuradoria-Geral da República.
Falcão – É um relatório que instiga e acusa. Mas, para condenar, você precisa ter provas materiais. Em caso de dúvida, é pró-réu. Não acredito em condenação, a menos que seja um processo político.
O QUE FEZ
Mineiro de Pitangui, formado em Direito, foi jornalista antes de entrar na clandestinidade. Foi integrante da VAR-Palmares, organização comunista que praticava a luta armada contra a ditadura mlitar, onde também militou a presidente Dilma Rousseff
CARREIRA POLÍTICA
Fundador do PT, foi quatro vezes deputado estadual, uma vez federal e secretário da prefeita Marta Suplicy em São Paulo