Dep Zarattini: A legislação anti corrupção também tem seus exageros e desvios. Vejam este comentário da Dra. Izabel Franco, advogada especialista em legislação contra a corrupção.
Denunciar virou um bom negócio
Encerrando o mês de maio, a SEC (Comissão de Valores Mobiliários dos EUA), finalmente adotou a regulamentação do polêmico programa de delação criado no bojo da lei americana “Dodd-Frank Act”. O cerco contra fraudes e corrupção empresarial fecha-se ainda mais. Essas novas regras praticamente incentivam o funcionário de empresas com valores negociados em bolsas de valores dos EUA a se tornar um informante se suspeitar de pagamento de propinas por sua companhia. E isso vale tanto para as subsidiárias brasileiras de companhias americanas de capital aberto quanto para as empresas brasileiras listadas lá fora. As empresas devem melhorar seus programas de compliance para minimizar os riscos contra delações, não só de bem intencionados empregados com motivações morais e éticas, mas contra potenciais caçadores de tesouros.
A Lei Dodd-Frank, sancionada em 2010, mas somente regulamentada ao final de maio passado, permite que a SEC recompense delatores em 10% a 30% das quantias por ela recuperadas quando a condenação tenha se valido de informações importantes fornecidas pelos denunciantes (carinhosamente referidos pela lei como “whistleblowers”, ou seja, aquele que “assopra o apito” e “põe a boca no trombone”). O programa de delação da Lei Dodd-Frank terá impacto ainda desconhecido no mundo dos negócios e nas relações entre empregados e respectivos empregadores. Empresas no mundo todo ainda tentam acertar na adoção de eficientes programas de compliance, mas, com a nova lei, seus esforços poderão ser tripudiados pelos delatores. Isso porque agora os empregados terão fortes incentivos em comunicar infrações às autoridades americanas ao invés de primeiramente informar a sua própria empresa, colocando seu próprio interesse econômico à frente de sua lealdade com os empregadores.
Novas regras praticamente incentivam o funcionário de empresas listadas em bolsas de valores dos EUA a se tornar informante
Especificamente de interesse dos brasileiros, a Lei permite que as recompensas premiem não só empregados de subsidiárias de companhias abertas americanas e de grandes grupos brasileiros com papéis nas bolsas americanas, mas também sócios, representantes, contratados, consultores, agentes e outros terceiros que de alguma forma se envolvam com a companhia. Pior, a Lei permite até denúncias anônimas, se feita através de advogados.
Aliás, o funcionário que antes temia revelar a seus superiores ou aos canais internos adequados o conhecimento de infrações será agora não só premiado como protegido pela Lei. De fato, a Lei garantirá proteção ao delator contra retaliação permitindo que o funcionário e a SEC processem o empregador emcaso de demissão ou discriminação por suas denúncias.
Em vista dos claros riscos que a nova lei apresenta às companhias abertas particularmente com respeito à legislação anticorrupção (a Lei FCPA - Foreign Corrupt Practices Act) é prudente que as subsidiárias brasileiras e as empresas brasileiras com papéis nos EUAreavaliem seus programas de compliance, especialmente os treinamentos. Pois, vejam a ironia: essa mesma empresa que, nesses treinamentos, faz um incrível esforço para comunicar a seus funcionários as extremas exigências às quais se sujeita sob as leis americanas, enfatizando todos os preceitos de ética, honestidade e integridade e apelando aos empregados locais que andem na linha, poderá subsidiar o prêmio que o funcionário receberá se ele denunciar a empresa diretamente às autoridades americanas.
Melhor mesmo é precaver-se com um programa de compliance de primeira, com monitoramentos constantes, além de, levar muito a sério qualquer denúncia de seus funcionários, o que, infelizmente, não ocorre no Brasil.
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