O Bilhete Único Mensal, uma das propostas da área de transportes de
Fernando Haddad, candidato do PT à Prefeitura de São Paulo, virou
polêmica.
Em 24 de agosto, o programa de rádio de José Serra, candidato do PSDB
à sucessão de Gilberto Kassab (PSD), chamou-o de “bilhete mensaleiro”,
em alusão ao mensalão, em julgamento do Supremo Tribunal Federal Federal
(STF).
No mesmo programa, um suposto eleitor questiona:
Tem candidato prometendo um bilhete mensaleiro. Mas assim fica mais
caro porque estou pagando transporte mesmo quando estou dormindo, já
paguei pelo mês inteiro. E no dia que eu estiver em um churrasco em
casa? Já vou ter pago e não vou aproveitar?
Sem citar nomes, outro suposto eleitor responde:
Ele é o mesmo que criou a “taxa do lixo”, agora quer criar a taxa do bilhete mensaleiro. Eu não caio nessa, é só blá blá blá.
A fala é referência à “taxa do lixo”, tributo implantado na gestão
Marta Suplicy (2001 a 2004), que a oposição apelidou de “martaxa”.
Nos últimos dias, inclusive hoje, 31 de agosto, um dos destaques do
site da campanha de Serra é justamente um filme de animação sobre o tema.
O filme diz:
Você lembra da taxa do lixo? Foi o Hadadd que fez. Agora ele quer
criar uma nova taxa. A taxa do ônibus. Isso mesmo. Mas sem o nome de
taxa, né? Estão chamando de Bilhete Único Mensal. Eu vou explicar: o
Bilhete Único que ele quer criar agora que você paga mesmo que não use o
transporte. R$ 150 reais por mês. Quer dizer você ficou em casa vendo o
futebol? Paga! Você foi andar de bike no parque? Paga! Ficou jogando
videogame com os amigos? Paga!!! Você paga 30 dias por mês, usando ou
não. Que bela novidade, hein? PT e suas taxas. O velho jeito de
governar. Em nova embalagem.
“Em primeiro lugar, acho que os técnicos em Transportes da Prefeitura
e os tucanos não entenderam bem a nossa proposta”, estranha o deputado
federal Carlos Zarattini (PT-SP). “Num filminho que está na internet,
eles dizem que a pessoa vai pagar independentemente de usar ou não o
bilhete. Isso não é verdade. Pena que eles não compreenderam, mas o povo
está entendendo e gostando.”
“Em segundo lugar, dizer que é bilhete mensaleiro é uma tentativa de
desqualificar a nossa proposta”, prossegue Zarattini. “Mas não pega. O
povo já sabe que o bilhete mensal é economicamente vantajoso.”
Viomundo – O senhor imaginava que a proposta do Bilhete Único Mensal fosse gerar essa polêmica?
Carlos Zarattini – Não me surpreendeu. Foi assim lá
atrás com o projeto do Bilhete Único. Em 1995, eu o apresentei na Câmara
Municipal e foi aprovado. Porém, Paulo Maluf [na época, prefeito da
capital], vetou-o. Nós só conseguimos implantá-lo aqui durante o governo
Marta.
Na época, propusemos que fosse feito junto com o metrô e os trens.
Alckmin era o governador e se recusou a fazer a integração. Disse que o
Bilhete Único não ia dar certo.
Iniciamos, então, apenas com os ônibus que são controlados pela
Prefeitura. Foi um processo muito difícil, pois tínhamos quase 20 mil
peruas clandestinas e as empresas de ônibus estavam quase falidas. A
operação exigiu reorganização do sistema de transporte na capital,
inclusive mudança na legislação. E, agora, estamos propondo a ampliação
do Bilhete Único.
Viomundo – Afinal, o que é o Bilhete Único Mensal?
Carlos Zarattini — A concepção do Bilhete Único é
simples: a pessoa paga uma única vez para chegar ao seu destino,
independentemente de quantos ônibus ou lotação usar. Hoje, você pode
usar durante 3 horas até 4 conduções. Quando lança mão de metrô ou trem,
paga um adicional.
Agora, queremos ampliar o Bilhete Único. O objetivo é fidelizar quem
recorre ao transporte público todo dia e, ao mesmo tempo, baratear o
custo para esse (a) cidadão (a).
Cada pessoa vai poder escolher qual a melhor opção para si. Se for
usuária freqüente, é vantagem comprar o bilhete mensal. Se usuária
eventual, aí não traz benefício; o melhor é continuar carregando como
faz hoje.
Viomundo – O programa do Serra diz que a pessoa vai pagar independentemente de usar ou não.
Carlos Zarattini – Não é verdade, invenção tucana.
Viomundo – Quanto vai custar o bilhete mensal?
Carlos Zarattini — Nós estamos calculando quanto as
pessoas gastam nos seus dias de trabalho – normalmente são cinco por
semana. E, aí, multiplicamos pelo número de dias de trabalho ao longo do
mês. É quanto vai pagar.Porém, ela vai poder usar muito mais vezes sem
pagar nada. Por exemplo, ela vai poder empregá-lo gratuitamente nos
finais de semana, feriados, fora dos horários de trabalho. Mesmo na
hora do almoço, se a precisar ir ao banco pagar uma conta e voltar ao
emprego, ela poderá usar o transporte público sem gastar nada além.
Viomundo – Quanto vai custar para o usuário?
Carlos Zarattini – Para uma tarifa de ônibus de R$ 3, em torno de R$ 140.
Viomundo – Daria para o senhor detalhar?
Carlos Zarattini – Lembra-se de que eu disse que estamos calculando o valor com base no quanto as pessoas gastam nos seus dias de trabalho?
Bem, 45% dos usuários de transporte coletivo na cidade de São Paulo
empregam o vale-transporte oferecido pelo patrão. O cartão vem
exatamente com o número de dias úteis do mês. Se utilizá-lo no final de
semana, por exemplo, vai faltar um dia no final do mês e a pessoa terá
de pagar do próprio bolso. Isso é o que acontece no sistema atual.
Já com o Bilhete Único Mensal, não. A pessoa que o utilizar
cotidianamente para ir e vir do trabalho terá o benefício de empregá-lo
gratuitamente em outros horários e nos finais de semana, sem nenhum
custo adicional.
Portanto, é mentira a propaganda tucana de que a pessoa vai pagar e não vai usar.
Viomundo – O usuário do vale-transporte fica então numa camisa-de-força?
Carlos Zarattini – Exatamente. O mesmo acontece com o
bilhete do estudante. Hoje, ele só pode usar nos dias úteis, quando tem
aula. Se, no final da semana, o jovem quiser ir à biblioteca, ao cinema
ou a um show, ele não passa na catraca, ela trava.
Por isso, a nossa proposta é que exista o bilhete mensal do estudante
e que ele funcione nos mesmos moldes do bilhete mensal, ou seja, sem
nenhuma restrição.
Viomundo – Mas 55% dos usuários não têm o vale-transporte.
Pagam do próprio bolso. E às vezes não têm dinheiro para comprar o
bilhete para o mês inteiro. Aí, como fica?
Carlos Zarattini — Nós vamos ter também a modalidade semanal. A pessoa vai poder comprar por semana.
Viomundo – E o valor os cerca de RS$ 140 seriam divididos por quatro semanas?
Carlos Zarattini – Exatamente Embora ela pague por
cinco dias (10 passagens), ela vai poder utilizá-lo quantas vezes
quiser, inclusive nos finais de semana, sem qualquer restrição.
Viomundo – Como fica a situação do usuário ocasional?
Carlos Zarattini – Vai fazer como hoje em dia, ou
seja, carrega o Bilhete Único quando necessário. E mesmo quem paga o
ônibus em dinheiro, na hora – muita gente faz isso –, vai poder
continuar fazendo isso.
Essa é ideia geral. Cada pessoa escolhe a melhor opção para condições e necessidades dela.
Viomundo – E quanto à validade, como funcionará?
Carlos Zarattini — Vale a partir do dia em que a
pessoa comprou. Por exemplo, o mensal. Vamos supor que você comprou no
dia 12. Ele vai valer até o dia 12 do mês seguinte. O semanal, mesma
coisa. A semana passa a contar a partir do dia em que ela comprou.
Viomundo – Onde o bilhete mensal já está em uso?
Carlos Zarattini – Todas as grandes cidades dos
Estados Unidos, como Nova York e Washington, e Europa, como Paris e
Londres, têm. Você chega nesses locais e, dependendo do tempo em que vai
ficar, compra o bilhete para um mês, uma semana. E, durante esse
período, utiliza quantas conduções quiser. Muitas pessoas que viajam
para o exterior, já tiveram essa experiência e sabem que vale a pena.
Viomundo – O bilhete mensal vai ser integrado com metrô e os trens da CPTM?
Carlos Zarattini — A nossa ideia é chegar lá. Nós
queremos que o metrô, os trens da CPTM e os ônibus intermunicipais sejam
integrados ao Bilhete Único Mensal.
Viomundo – Quem vai arcar com os custos adicionais?
Carlos Zarattini — No caso da Prefeitura, ela paga
às empresas de ônibus e lotação, de acordo com o número de passageiros
transportados. Consequentemente, nós vamos ter um acréscimo no
subsídio.
Já o metrô e a CPTM, que são empresas estatais, não têm custo
adicional para transportar esses passageiros. Eles já estão funcionando.
Nos horários de pico, já funcionam com carga máxima. Nos demais
horários, têm capacidade ociosa. Então o custo para o metrô e a CPTM é
absolutamente zero.
De modo que eu não vejo nenhum motivo para o governo do Estado
rejeitar o Bilhete Único Mensal no metrô e na CPTM, assim que
implantarmos o bilhete mensal nos ônibus e lotações.
Hoje, como já disse, existe um adicional quando a pessoa utiliza o
metrô ou o trem. Nós vamos ter de negociar um pequeno adicional para
possa utilizá-lo também no metrô e nos trens da CPTM. Do ponto de vista
técnico, isso pode ser facilmente resolvido.
Viomundo – Qual a sua expectativa em relação ao Bilhete Único Mensal?
Carlos Zarattini – Imagine uma pessoa que mora no
extremo Sul ou Oeste da capital, tem vale-transporte e todo dia usa o
transporte público. Ela só tem a ganhar. Vai poder andar sábado,
domingo, feriados, sem gastar nada.
Aliás, um dos maiores problemas democráticos na cidade de SP é a
falta de circulação. Tem uma pesquisa chamada Origem-Destino, feita de
10 em 10 anos, que mostrou que as pessoas de alta renda têm uma taxa de
mobilidade muito superior às de baixa renda, que praticamente só têm
mobilidade para ir e vir do trabalho.
Nós queremos acabar com essa limitação e ampliar a possibilidade de
as pessoas de baixa renda conhecer a cidade, participar das atividades
de fim de semana.
Nós queremos que elas tenham ampla mobilidade. Queremos dar-lhes a
oportunidade de andar pela cidade e usufruir um sem número de atividades
de lazer de gratuitas nos finais de semana, como shows, passeios. E que
elas não não vão poder deixar de ir simplesmente porque não têm
dinheiro para o transporte. Queremos acabar com isso.
Viomundo — Supondo que Haddad ganhe a eleição e o governador
vete, como em 2004, a integração do bilhete mensal com o metrô e os
trens da CPTM, o que acontecerá?
Carlos Zarattini — Nós vamos pressionar
politicamente o governador para que aprove a integração e, ao mesmo
tempo, mostrar à população o prejuízo que ela terá [em caso de veto do
governador]
Fonte: Spresso SP - http://virou.gr/N3Xjt5